Ensaio referencial para o feminismo desde sua publicação, nos anos 1970, O riso da Medusa se constrói a partir da incômoda ausência de vozes femininas entre tudo o que circula na paisagem da literatura, da teoria e da crítica. Se o mito da Medusa alude à castração da mulher, a um sentido negativo e monstruoso historicamente atribuído a uma falta do falo, este texto de Hélène Cixous evoca a urgência de que as mulheres afirmem sua presença no texto.
Para a autora, pioneira nos estudos de gênero na Europa, longe de se opor ao masculino, o feminino é indefinido, imprevisível na afirmação de sua diferença: a escrita feminina surge quando a mulher toma posse de seu corpo. E então passa escrever, com prazer, em sentidos sempre renovados pela imaginação. Sem censuras. Sem decapitações. Sem cobrir com a mão o próprio riso.
Circa l’autore
Hélène Cixous nasceu em 1937 em Orã, na Argélia. Sua mãe, Eve Klein, era médica obstetra (sage-femme) de origem judaica. Seu pai, George Cixous, também médico e judeu, nasceu em Orã e faleceu de tuberculose quando a filha tinha apenas dez anos. A autora deixou a Argélia em 1955 e iniciou seus estudos na França, obtendo a Agrégation (um dos concursos mais importantes no setor da educação francesa) em Inglês em 1959 e defendendo, quase uma década depois, sua tese de doutorado sobre James Joyce.
Na década de 1960, participa de diversas iniciativas dos movimentos de mulheres no país e do movimento contestatório que tomou conta das universidades em Paris, em maio de 1968. Ao lado de Jacques Derrida, com quem nutre uma forte amizade ao longo de toda a vida, participa da criação da Universidade de Vincennes (Paris 8), onde funda o hoje chamado Centro de Estudos Feministas e de Estudos de Gênero, pioneiro na Europa. Hélène Cixous funda igualmente a revista Poétique, com Tzvetan Todorov e Gérard Genette em 1969.
A autora começa a publicar em 1967 (Le prénom de Dieu) e não para: contam-se hoje quase cinquenta obras de ficção, mais de trinta ensaios e quatorze peças de teatro, pelas quais recebeu diversos prêmios, como o Prêmio Médicis em 1969 e o Prêmio Marguerite Duras em 2014. Pela obra ‘de rara poesia’ e pelo seu engajamento intelectual, ganha também, em outubro de 2021, o Prêmio da Biblioteca Nacional da França.
Ficou conhecida no Brasil por ter sido uma das grandes promotoras da obra de Clarice Lispector na França, na Inglaterra e nos Estados Unidos (ver, por exemplo, o ensaio L’heure de Clarice Lispector).