Nessa narrativa breve, Maria Firmina dos Reis, autora homenageada na FLIP 2022, cria uma história de amor, conflito e traição, que envolve povos indígenas e europeus no Nordeste brasileiro
‘Gupeva, romance brasiliense’ é um texto complexo e tortuoso que conta o amor voraz entre o francês Gustão e a indígena Épica, assim como a oposição daqueles que gravitam em torno dos personagens. Com uma paixão cega e arrebatadora, mas que colide com tabus, resta ao casal enfrentar o destino e lidar com revelações surpreendentes, capazes de impedir a relação entre eles.
Ao mobilizar os principais elementos do romantismo e do indianismo, o texto de Maria Firmina compõe um importante registro da literatura no século XIX, dialogando com obras clássicas e fundindo debates sociais que a autora traz à tona. Voz dissonante na literatura brasileira, Maria Firmina dos Reis é reivindicada como primeira romancista brasileira. A autora é homenageada na edição 2022 da FLIP (Festa Literária Internacional de Paraty).
Circa l’autore
Maria Firmina dos Reis foi escritora e contista, reivindicada como precursora, pela autoria do primeiro romance escrito por uma mulher no país. O reconhecimento dessa posição inaugural na tradição é resultado do revisionismo do cânone literário proposto pela crítica feminista. Isso permitiu reavaliar e reeditar obras de sua autoria ou atribuídas a ela, como o romance Úrsula. Consta ainda que teria publicado, em época posterior ao Romantismo, um conto intitulado ‘A escrava’, que bem atesta seu posicionamento pró-abolição. A narrativa breve aqui selecionada também foi obra reabilitada por essa crítica revisionista. Ao que parece, teve mais de uma edição, com versões que apresentam algumas variantes, em números de distintos periódicos. Elegemos aquela que parece ser a versão mais acabada da história, que funde a matéria indianista com outros temas, inclusive um tema tabu… A narrativa é, por vezes, um tanto tortuosa, em parte devido ao fato de a protagonista ter o mesmo nome da mãe: Épica. Nome curioso, aliás, pelo gênero de narrativa em questão. Vale destacar que a história se articula, em dada medida, com a de Paraguaçu, a índia convertida, esposa do náufrago português Diogo Álvares Correia, o Caramuru. A história de Caramuru e Paraguaçu consta do poema indianista de Santa Rita Durão ‘Caramuru’, o que sugere uma possível interlocução de ‘Gupeva’ com esse famoso épico setecentista.