Toda boa literatura é, de algum modo, o descortinamento de um segredo. Cada personagem é uma questão, e cada movimentação no tempo e no espaço imaginários, uma forma de percorrer possibilidades e abrir caminhos.
No campo oposto à literatura, o mundo das letras, costuma-se colocar o mundo da álgebra, dos números. Mas, se há algo em comum entre letras e números, é essa possibilidade de fazer nascer uma linguagem que ao mesmo tempo propõe e resolve enigmas.
Paloma Franca Amorim, neste seu primeiro romance pensado originalmente como tal (porque Eu preferia ter perdido um olho é, de certo modo, um romance construído pelo feliz amálgama de contos e crônicas), propõe, assim, desde o título, O Oito, um espaço a ser desvendado.
O Oito é um bar de Belém, capital do Pará, que reúne uma juventude em transformação. Uma geração, registrada por Paloma, que se confronta com preconceitos e violências estruturalmente arraigados, com diferentes formas de produzir dor e injustiça.
Esse bar, que de fato existiu e foi duramente atacado por uma elite tipicamente brasileira (vou aqui poupar o leitor dos adjetivos que gostaria de escrever), era um lugar de encontro de pessoas que buscavam construir uma cidade em que se pudesse respirar, uma cidade em que o ar é ainda mais quente e mais abafado como metáfora do que como realidade.
Paloma não escreve sobre o oito numeral, mas eu não consigo deixar de pensar que, nesses tempos que vivemos, oito é também o número atômico do oxigênio.
Haroldo Ceravolo Sereza
Sobre o autor
Paloma Franca Amorim nasceu no ano de 1987 em Belém do Pará é licenciada em Artes Cênicas pela Universidade de São Paulo. Em 2017, lançou seu primeiro livro de contos, ‘Eu Preferia Ter Perdido Um Olho’, publicado pela Alameda Casa Editorial. Além de escritora, é pesquisadora de artes da cena, educadora e artista visual.