O que fazer, pergunta-se o cronista, no universo em desencanto sem primavera alguma a chegar? Como preservar o carinho pelo ínfimo do dia a dia em meio à estridência reacionária que, ágrafa, se apossou das ruas na última década? O pensador Bacanaço tudo disse: ‘– Pense numa ventania! Só sei que comecei vendendo camisetas tipo Che, Bakunin e 'Não vai ter Copa'… Quando vi estava negociando símbolos da Pátria, bandeiras do Brasil, adesivos e canecas 'Fora Dilma'’.
Democracia certamente em vertigem, como reencantar o cotidiano? Talvez recorrendo a Heráclito: ‘Não se bebe duas vezes no mesmo bar-bodega’. E, na dialética da história, recordar a mescla inspirada de Caetano Veloso sampleando Orestes Barbosa na voz do Rei: ‘Tudo vai mal/ Tudo, tudo, tudo, tudo/ Tudo mudou/ Não me iludo e contudo/ É a mesma porta sem trinco/ o mesmo teto, mesmo teto/ E a mesma lua a furar/ Nosso zinco’.
Xico Sá redescobre o possível encanto do dia a dia por meio da releitura da própria história da crônica e da cultura popular, pois ‘é no caos, nunca no poste da história, que se busca uma verdade’. O claro enigma revela a engrenagem da máquina do mundo: no fundo, menos do que retrato oblíquo, a crônica, espelho sem moldura, inventa o mundo no qual enfim podemos nos reconhecer.
João Cezar de Castro Rocha
Об авторе
Xico Sá nasceu no Crato (CE) e iniciou sua trajetória profissional no Recife. É autor de Big Jato (Companhia das Letras), A Falta (Planeta) e Sertão Japão (Casa de Irene), entre outros livros. No jornalismo, obteve os prêmios Esso, Folha, Abril e Comunique-se. Na TV, atuou em Amor & Sexo (Globo), Papo de Segunda (GNT), Cartão Verde (Cultura) e Redação (Spor TV). É apresentador do canal ICL Notícias e colunista do Diário do Nordeste.