Unidos por um catálogo de produtos de serralheria da marca Kramp e viagens num Renault velho por estradas, povoados e cidades, uma filha cresce ao lado de seu pai, caixeiro-viajante, a aprender ensinamentos sobre o mundo e vida. Da infância à adolescência, M narra seus aprendizados e o correr dos anos, até o evento que marca uma ruptura na família, acionando o dispositivo dos sintomas parentais e outras rupturas e mais questionamentos sobre o universo e as peças que não se encaixam, as dores desparafusadas que se acumulam, e o revelar das engrenagens discretas do afeto rangendo no crescer da sua maturidade.
Nas viagens com o pai, D, e o consequente reacender da vida da mãe em casa, após um assombrar violento do passado, M percebe, ainda adolescente, que os mecanismos das Coisas no Mundo avançam com giros imprecisos, impossíveis para cálculos e categorias, e começa assim a aceitar perguntas inclassificáveis no maquinário das perdas e do tempo, em revelações de que infortúnios tidos improváveis podem transformar construções familiares sólidas em ‘um monte de palitos’.
Ao voltar do livro, um dos caminhos mais difíceis e também confortáveis da viagem, vivenciamos com M o despertar para as precariedades de uma família a sofrer o desvanecimento de suas relações, e entendemos um dos mecanismos da existência (‘um único parafuso pode precipitar o fim do mundo’) e que muito do que resta nesse sistema de sobrevivência até o futuro é estranho, mas também revelador.
Raimundo Nonato, escritor e psicólogo
Despre autor
María José Ferrada, nascida em 1977 no Chile, é jornalista e escritora. Seus livros infantis já foram publicados em diversos países. Kramp, seu primeiro romance, foi o primeiro trabalho a receber os três prestigiados prêmios literários chilenos: o Prêmio de Melhor Romance do Círculo de Críticos de Arte, o Prêmio de Melhores Obras do Ministério da Cultura (categoria romance) e o Prêmio Municipal de Literatura em Santiago.